Seleção brasileira em um dos jogos da Copa do Mundo de 1970, que aconteceu no México
por THELL DE CASTRO
A Copa do Mundo de 1970, no México, foi a primeira a ser transmitida pela TV, ao vivo, via satélite, para praticamente todo o Brasil: 54 milhões de brasileiros puderam acompanhar as partidas. De 1938, na França, até 1966, na Inglaterra, era o rádio que mobilizava multidões com sua cobertura. A partir de 1970, a TV tomou a preferência.
Mas não pense que a cobertura da televisão foi grandiosa, 24 horas por dia, como temos atualmente. Apesar de o Brasil ter recebido as imagens coloridas, a TV da época ainda era em preto e branco. Poucos afortunados, como o presidente Emílio Garrastazu Médici, viram em cores os brasileiros sagrarem-se tricampeões.
Como a maioria não tinha acesso à tecnologia e estava curiosa para ver as maravilhas da nova transmissão, a Embratel programou diversas demonstrações, exibindo jogos em cinemas e outros locais públicos no Rio, em São Paulo e em Brasília.
Esforço técnico
A Embratel contou com uma equipe de 40 pessoas para cuidar da transmissão da Copa para as emissoras. As imagens captadas no México eram enviadas, por meio do satélite Inter-Sat III F-6, localizado na altura de Fernando de Noronha.
De lá, as imagens eram transmitidas para as antenas de Itaboraí, interior do Rio, e do Edifício Itália, em São Paulo. O Rio distribuía as imagens para Centro-Oeste e Nordeste, enquanto São Paulo enviava para o Mato Grosso e o Sul do país. O custo total das transmissões, na época, ficou em US$ 1 milhão.
Repeteco
O brasileiro viu, estupefato, a qualidade das imagens transmitidas diretamente do México, enquanto exibições de jogos no Brasil eram sofríveis. À revista Veja de 17 de junho 1970, Rogério Venegas, do Tele-Sistema mexicano, explicou que não havia espaço para improvisação. Os técnicos da transmissão, quase todos engenheiros, fizeram cursos a partir de 1967.
Foram usadas seis câmeras: uma atrás de cada gol, três ao longo de um dos lados do campo e duas no estúdio do estádio. Após a Copa, boa parte das inovações do mundial foi implantada nas emissoras brasileiras.
Uma das grandes novidades do torneio foi a inserção do replay, com repetições das jogadas. No Brasil, o lance ganhou o nome de repeteco.
Direitos de transmissão
Até 1968, a transmissão da Copa do México para o Brasil era incerta. O governo brasileiro alegava falta de dinheiro e precisava construir a estação captadora da imagem via satélite. No ano seguinte, foi inaugurada a grande antena em Itaboraí (RJ), ao custo, na época, de US$ 1,5 milhão.
Aí começou outra parte complicada: a negociação dos direitos. Não era como atualmente que a Fifa detém a transmissão e vende às emissoras interessadas. José Andrade de Almeida Castro, um dos pioneiros da televisão brasileira, representando a TV Tupi, procurou o magnata Emilio Ascarraga, dono de três canais mexicanos (a futura Televisa) e detentor dos direitos da Copa para todo o mundo.
Anúncio de transmissão de partida da Copa de 1970 pelo pool formado por Globo, Tupi e REI
Foi só na terceira tentativa de negociação que se chegou a um consenso. Ficou acertado que a transmissão seria feita no formato de pool, com Tupi, Globo e REI (Rede de Emissoras Independentes) recebendo o mesmo sinal e compartilhando os minutos das partidas diretamente do México entre seus narradores e comentaristas.
(Rui Porto)O que se viu na tela foi algo impensável nos dias de hoje: cada trecho do jogo era transmitido por uma equipe de cada emissora. Nomes como Geraldo José de Almeida e João Saldanha, da Globo; Walter Abrahão, Geraldo Bretas ou Oduvaldo Cozzi, além de Rui Porto, da Tupi; e Fernando Solera e Leônidas da Silva, da REI, entre outros.
Apenas 11 jogos foram transmitidos ao vivo para o Brasil. Todas as partidas da seleção de Zagallo, além da abertura, entre México e União Soviética, outras três partidas da primeira fase, uma semifinal, entre Itália e Alemanha, e a decisão do terceiro lugar, entre Alemanha e Uruguai.
Todos os outros jogos foram exibidos em VT às 23h, nas três redes, simultaneamente para Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília. As demais cidades recebiam as partidas por via aérea ou pela Embratel e mostravam quando bem entendessem.
Nem todas as localidades brasileiras receberam as transmissões da Copa. Amazonas, Maranhão, Piauí e os então territórios de Roraima, Rondônia e Amapá não assistiram às partidas. O Pará já contava com emissora própria, mas só viu os jogos pelos videotapes.
Audiência
A transmissão ao vivo da Copa do Mundo, evidentemente, mudou a rotina do país. A venda de aparelhos de TV disparou. Segundo reportagens da época, a procura superou em 50% a média normal do restante do ano.
Aulas foram canceladas, e o público saiu mais cedo do trabalho. Repartições públicas decretaram pontos facultativos ou, pelo menos, o expediente terminava mais cedo. O público se reunia em praças para ver os jogos pela TV. O Brasil, literalmente, parava em dias de jogos.
De acordo com o Ibope, na partida da estreia, no então Estado da Guanabara (hoje Rio de Janeiro), a média de audiência foi de 93% de aparelhos ligados das 19h às 22h, índice comparável apenas à chegada do homem à Lua e alguns programas de Silvio Santos, imbatível na época. A final teve 100% de audiência e ruas às moscas, exceto nas aglomerações populares para acompanhar a partida.
No mundo, estima-se que 700 milhões de pessoas viram àquela Copa pela TV.
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